sábado, 25 de abril de 2009

Saindo do armário.

Não, eu não. Eu já estou fora do armário há muito tempo.
E parem de pensar em opções sexuais. Não estrou tratando disso agora.
Falo das pessoas éticas e com senso social. Estas não podem ficar só reclamando para si mesmas e esperando as coisas acontecerem. Não podem ficar como se estivessem numa escuridão, escondidas dos outros que atacam o Estado de Direito.
Têm que sair do armário da omissão!
Foi essa bela mensagem que nos passou a gerente regional da Brasil Telecom, Andréia da Silva Frotta, que responde pelos estados de Goiás e Tocantins e pelo Distrito Federal.
O que fez Andréia?
Se negou a atender uma ordem judicial. Foi isso. Recusou atendimento a uma ordem judicial que considerou ilegal, absurda e violadora dos direitos da população.
E, tendo consultado a sua assessoria jurídica (na pessoa da advogada Elisa Lima Alonso, outra que está fora do armário escuro da omissão), tomou a única atitude possível para combater uma ordem ilegal emanada do Judiciário... foi ao Judiciário.

A ORDEM ILEGAL

A valorosa gerente Andréia Frotta se negou a cumprir decisão judicial que determinava (pasmem!) a quebra do sigilo telefônico de TODOS os usuários da companhia em 139 municípios do interior paulista, além de TODOS os clientes de outros CINCO ESTADOS (São Paulo, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina) E DO DISTRITO FEDERAL. (Ou seja: você, o Gilmar e mais 10, o Temer e os outros 512, o Sarney e 80 outros, o Lula e seus 3721 Ministros e eu. Além de 6 Governadores e seus Secretários e sabe-se lá quantas dezenas de milhares de prefeitos e vereadores.) e os seus vizinhos.

A ordem absurda partiu do juiz de direito Robledo Mattos de Moraes, de São José do Rio Preto e atendeu a uma solicitação do delegado de polícia local Guerino Solfa Neto e do membro do Ministério Público de São José do Rio Preto.

O delegado queria (e o juiz atendeu) que a empresa entregasse à Polícia os dados cadastrais dos assinantes junto com os CPFs, os extratos telefônicos de ligações feitas e recebidas em qualquer período solicitado, o rastreamento em tempo real de estações de rádio (ERB), o histórico das chamadas, além de dados dos IPs requisitados pela autoridade policial.

A RECUSA

Andréia se negou a cumprir ordem com conteúdo tão genérico e ilícito. Então, corajosamente, resolveu enfrentar a fúria do dragão que bufava em sua nuca a baforada quente da ameaça de prisão pelo crime de desobediência (art. 330 do Código Penal, com pena de até seis meses de cadeia. Para nossos anestesiados fascínoras isso é nada, mas é ameaça demais para as pessoas de bem).

Impetrou, assim, um Habeas Corpus Preventivo (instrumento de cidadania) junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo, sustentando a licitude da desobediência, a ilegalidade da ordem, alegando que a decisão violava a privacidade dos usuários e a Lei Geral das Telecomunicações (Lei nº 9.472/97). Alegou, ainda, que seria impossível a quebra de sigilo de forma genérica, sem individualização de pessoas e situações e definições de limites temporais.

A VITÓRIA

O Tribunal de Justiça concedeu o Habeas Corpus, declarando ilegal a decisão do Juiz de São José do Rio Preto. Considerou que a a Lei 9.296/96 estabelece 15 dias para as escutas, com uma renovação por igual período. Para o Tribunal, o uso dos grampos na forma como foi estabelecido pela justiça de primeiro grau era uma devassa à privacidade.

Deu o HC, mas não sem alguma divergência. O que, para mim, já é também revelador de outra mazela... mas isso é assunto para outra postagem.

Vejam alguns comentários dos Desembargadores ao dar sua decisão:

“Esse caso é emblemático, pois retrata o abuso que impera hoje na nação de, sem justificativa, bisbilhotar a vida das pessoas”, disse o desembargador Penteado Navarro.

“É dessa maneira que se faz com que as escutas telefônicas atinjam até as mais altas autoridades do país, como ministros do Supremo, senadores, deputados e ministros de Estado”, completou Penteado Navarro

“A Justiça não pode permitir que se instale no país um estado policial em nome da defesa do Estado”, completou o presidente da 9ª Câmara Criminal, desembargador Souza Nery.

“Se anteriormente outras pessoas tivessem tomado a mesma atitude [da gerente] não teríamos assistido os escândalos de grampos telefônicos patrocinados por autoridades federais”, concluiu Souza Nery.

Está aí. Celebremos uma vitória do Estado Democrático de Direito. Venceu a razoabilidade.

Celebremos a atitude corajosa da gerente regional da Brasil Telecom, Andréia da Silva Frotta, que detectou a injustiça e a ilegalidade e não se conformou com ela. Agiu. E agiu bem. Não ficou trancada na escuridão, no silêncio da omissão.

Saiu do armário.


"O que mais me preocupa não é o grito dos violentos,
nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem
caráter, nem dos sem ética.
O que mais me preocupa é o silêncio dos bons"

( Frase atribuída a Martin Luther King)